Sequestro, tortura, tráfico de drogas e até o relato de assassinatos
fazem parte da investigação da Polícia Federal (PF) que começou a
desbaratar uma quadrilha encastelada no Departamento Estadual de
Investigações sobre Narcóticos (Denarc). Os papéis da Operação Dark Side
mostram que os homens do Denarc atraíam traficantes internacionais para
São Paulo para sequestrá-los e achacá-los, além de roubar a droga e
revendê-la a bandidos amigos. O esquema funcionaria desde 2004 e,
segundo o delegado-chefe da PF em Sorocaba, Roberto Boreli Zuzi, teria
desviado pelo menos três toneladas de cocaína.
A PF está apurando o patrimônio dos sete policiais civis presos. Seis
deles são do Denarc e um da Delegacia de Investigações Sobre
Entorpecentes (Dise), de Sorocaba. Segundo o delegado Zuzi, se não
comprovarem a origem do patrimônio, os policiais também serão acusados
de lavagem de dinheiro. Alguns dos presos ostentariam patrimônio
incompatível com a renda e teriam usado dinheiro da droga para adquirir
apartamentos, chácaras e carros de luxo. O bloqueio dos bens foi pedido à
Justiça.
A PF desvendou o esquema quando monitorava um suspeito de tráfico em
Sorocaba, o empresário de jogadores de futebol Marcelo Athiê, que está
foragido. Ele seria o destinatário de um carregamento de 133 kg de
cocaína apreendido em 15 fevereiro na Rodovia Castelo Branco - outros
175 quilos estavam no apartamento do investigador Alexandre Lajes. Foram
presos então dois traficantes e os investigadores Lajes e Michael Ruiz,
do Denarc, e Glauco Fernandes, de Sorocaba, que escoltariam a droga.
Eles alegam inocência.
Depois de preso, Lajes conversou com a mulher pelo celular e pediu:
"Abre meu cofre, tira tudo que tem dentro e bota em uma sacola. Não
queira saber o que tem porque isso não te interessa". Uma câmera do
apartamento do casal em Perdizes, na zona oeste da capital, flagrou a
mulher arrastando sacolas. Os federais chegaram a tempo de apreender a
cocaína, 70 mil e US$ 84 mil, além de reais. Na última quarta-feira
foram presos mais quatro suspeito: os investigadores Gustavo Gomes,
Edson Melin, Mariano Pinto e André Souza, todos do Denarc. Eles também
alegam inocência.
A chamada Operação Dark Side mostra que os policiais forneceram a
bandidos até um Fiat Strada, apreendido pelo Denarc em 26 de outubro de
2010. Em fevereiro de 2012, o veículo foi flagrado pelos federais sendo
dirigido por Athiê e por um homem suspeito de tráfico.
Mortes. Os federais descobriram ainda que o investigador Lajes
aparecia como testemunha no inquérito sobre as mortes do colombiano
Bernardo Castanho Estrada e do argentino Fabian Alejandro Gugliese. O
crime aconteceu em 26 de novembro de 2011, no Guarujá. Lajes disse que
Estrada era seu informante. Segundo a versão apresentada pelos
envolvidos à Delegacia do Guarujá, o argentino teria tentado assaltar a
casa e o colombiano tentara impedi-lo. Ou seja, um teria matado o outro.
Em outubro de 2012, os federais interceptaram um telefonema do
investigador no qual ele diz ao seu chefe no Denarc que estava levando
"uns uisquinhos" supostamente para o delegado responsável pelo inquérito
das mortes no Guarujá.
O Guarujá era uma das cidades que abrigavam cativeiros de
traficantes. Um deles ficava em uma casa na Avenida Veraneio, na Enseda.
Um sítio em Ibiúna também fora usado para o mesmo fim.
No total, foram apreendidos 340 quilos de cocaína, carros e um
celular com o traficante boliviano Heber Carlos Berberi Escalante, com
imagens de um traficante acorrentado, pedindo à família para entregar
US$ 300 mil aos policiais para não ser morto. O próprio Escalante teria
pago US$ 1 milhão para não ser preso. A Secretaria da Segurança Pública
abriu os processos administrativos contra os investigadores presos. "As
últimas prisões contaram com a cooperação da Corregedoria da Polícia
Civil", disse o secretário Fernando Grella Vieira. FAUSTO MACEDO, JOSÉ
MARIA TOMAZELA e MARCELO GODOY
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