A Organização Mundial de
Saúde (OMS) reconhece, atualmente, o alcoolismo crônico como doença,
sob o título de ¿Síndrome de dependência do álcool¿. E o Tribunal
Superior do Trabalho firmou entendimento no sentido de que, no caso de
alcoolismo crônico, antes de punir o empregado, o empregador deverá
encaminhá-lo ao INSS e a tratamento médico, visando a reabilitá-lo. Se a
empresa dispensa o trabalhador alcoólatra, de forma imotivada, alguns
dias após suspendê-lo por comparecer embriagado ao trabalho, esse ato
deve ser entendido como discriminatório e abusivo, contrário à boa-fé e à
dignidade do trabalhador, ofendendo a Constituição Federal,
que adotou como princípios fundamentais a dignidade da pessoa humana e a
função social da empresa. Adotando esse entendimento, expresso no voto
da juíza convocada Maristela Iris da Silva Malheiros, a 2ª Turma do
TRT-MG deu provimento parcial ao recurso de um empregado e condenou a
empresa ao pagamento de R$10.000,00, por danos morais.
Na
reclamação, ele alegou ter sido dispensado de forma discriminatória 09
dias depois de cumprir uma suspensão por comparecer embriagado ao
trabalho. Disse sofrer de alcoolismo crônico e pleiteou indenização
substitutiva dos salários do período após a dispensa, outra por danos
morais e pensão vitalícia.
Ao julgar o recurso do trabalhador
contra a sentença que indeferiu os pedidos, a relatora citou o item II
da Súmula 378 do TST, pelo qual "São pressupostos para a concessão da
estabilidade o afastamento superior a 15 dias e a consequente percepção
do auxílio doença acidentário, salvo se constatada, após a despedida,
doença profissional que guarde relação de causalidade com a execução do
contrato de emprego". Ao verificar a prova pericial, a magistrada
observou que o reclamante não chegou a se afastar dos serviços por
período superior a quinze dias, com recebimento de auxílio doença
acidentário, além de não ter sido comprovada doença ocupacional causada
ou agravada pelas atividades dele na empresa ré. Assim, concluiu que não
era caso de estabilidade provisória no emprego e, por isso, indeferiu
os pedidos de indenização substitutiva e também de danos morais e
materiais, fundados na doença de natureza ocupacional.
Por outro
lado, segundo destacou a juíza convocada, a realidade do reclamante não
poderia deixar de ser considerada, uma vez que a prova pericial
demonstrou grave deterioração física e psíquica, com elevado grau de
incapacidade. E a origem desse quadro está associada ao alcoolismo
crônico, que levou à deficiência de vitamina B1, causando lesão do
sistema nervoso central e periférico, com sequelas irreversíveis. Ainda
que possa ocorrer alguma melhora limitada, condicionada à abstinência de
bebida alcoólica pelo resto da vida do reclamante, o perito não
acredita que esta melhora seja relevante, a ponto de restabelecer a
capacidade laborativa.
No entender da relatora existem provas
concretas quanto ao alcoolismo crônico do reclamante à época da rescisão
do contratual e os efeitos disso já repercutiam no seu trabalho, tanto
que lhe foi aplicada suspensão pelo fato de ter comparecido embriagado
ao local de trabalho. Ele, inclusive, chegou a agredir verbalmente seus
colegas, além de colocar em risco a execução dos serviços. Como o
empregado já se encontrava enfermo à época da rescisão, caberia à
empregadora encaminhá-lo ao INSS para tratamento. E, caso o órgão
previdenciário detectasse a irreversibilidade da situação, a solução
seria encaminhá-lo à aposentadoria.
A magistrada frisou que o
exercício de uma atividade de trabalho é um aspecto relevante no
tratamento do paciente portador de doenças psíquico-emocionais, como o
alcoolismo, tanto que existem notícias nos autos de que o reclamante
passou a beber mais após a sua demissão, além de ter piorado bastante o
seu estado de saúde. Situação essa que não foi considerada pela
reclamada ao concretizar a dispensa dele em momento de maior fragilidade
e, ainda, com cunho discriminatório: "Pelo que se pode inferir dos
termos da penalidade aplicada ao obreiro antes de sua dispensa, a
reclamada, antevendo as questões que decorreriam do agravamento do
estado clínico de seu empregado, procedeu à rescisão unilateral do
contrato de trabalho deste nove dias depois de suspendê-lo do trabalho.
Nesse contexto, tenho que o ato de dispensa imotivada do reclamante deve
ser reputado discriminatório e abusivo, contrário à boa-fé e à
dignidade do trabalhador, em ofensa à Constituição
da República que adota como princípios fundamentais a dignidade da
pessoa humana e os valores sociais e à função social da empresa (artigos
1º, III e IV, 3º, IV, 5º, I e XLI, 6º, 7º, I, XXX e XXXI, 170, III, VIII e 193, da Constituição da República)", concluiu a relatora.
Diante
dos fatos, a juíza convocada entendeu que caberia anular a dispensa e
determinar a reintegração do reclamante ao emprego. Mas, como ele pediu
apenas a indenização por danos morais, a Turma deferiu esse pleito, com
fundamento na dispensa indevida do empregado alcoólatra, arbitrando a
indenização em R$10.000,00.
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