O
engenheiro Léo Pinheiro cumpre uma rotina de preso da Operação
Lava-Jato que, por suas condições de saúde, é mais dura do que a dos
demais empreiteiros em situação semelhante. Preso há seis meses por
envolvimento no esquema do petrolão, o ex-presidente da OAS, uma das
maiores construtoras do país, obedece às severas regras impostas aos
detentos do Complexo Médico-Penal na região metropolitana de Curitiba.
Usa o uniforme de preso, duas peças de algodão azul-claras. Tem
direito a uma hora de banho de sol por dia, come "quentinhas" na própria
cela e usa o banheiro coletivo. Na cela, divide com outros presos o
"boi", vaso sanitário rente ao piso e sem divisórias. Dez quilos mais
magro, Pinheiro tem passado os últimos dias escrevendo. Um de seus
hábitos conhecidos é redigir pequenas resenhas e anexá-las a cada livro
lido. As anotações feitas na cela são muito mais realistas e impactantes
do que as literárias. Léo Pinheiro passa os dias montando a estrutura
do que pode vir a ser seu depoimento de delação premiada à Justiça.
Pinheiro foi durante toda a década que passou o responsável pelas
relações institucionais da OAS com as principais autoridades de
Brasília. Um dos capítulos mais interessantes de seu relato trata
justamente de uma relação muito especial - a amizade que o unia ao
ex-presidente Lula.
De todos os empresários presos na Operação Lava-Jato, Léo Pinheiro é o
único que se define como simpatizante do PT. O empreiteiro conheceu
Lula ainda nos tempos de sindicalismo, contribuiu para suas primeiras
campanhas e tornou-se um de seus mais íntimos amigos no poder. Culto,
carismático e apreciador de boas bebidas, ele integrava um restrito
grupo de pessoas que tinham acesso irrestrito ao Palácio do Planalto e
ao Palácio da Alvorada. Era levado ao "chefe", como ele se referia a
Lula, sempre que desejava. Não passava mais do que duas semanas sem
manter contato com o presidente. Eles falavam sobre economia, futebol,
pescaria e os rumos do país. Com o tempo, essa relação evoluiu para o
patamar da extrema confiança - a ponto de Lula, ainda exercendo a
Presidência e depois de deixá-la, recorrer ao amigo para se aconselhar
sobre a melhor maneira de enfrentar determinados problemas pessoais.
Como é da natureza do capitalismo de estado brasileiro, as relações
amigáveis são ancoradas em interesses mútuos. Pinheiro se orgulhava de
jamais dizer não aos pedidos de Lula.
Na semana passada, a reportagem de VEJA foi a Atibaia, região de
belas montanhas entrecortadas por riachos e vegetação prístina. Fica ali
o Sítio Santa Bárbara, cuja reforma chamou a atenção dos moradores. Era
começo de 2011 e a intensa atividade nos 150 000 metros quadrados do
sítio mudou a rotina da vizinhança. Originalmente, no Sítio Santa
Bárbara havia duas casas, piscina e um pequeno lago. Quando a reforma
terminou, a propriedade tinha mudado de padrão. As antigas moradias
foram reduzidas aos pilares estruturais e completamente refeitas, um
pavilhão foi erguido, a piscina foi ampliada e servida de uma área para a
churrasqueira. As estradas lamacentas do sítio receberam calçamento de
pedra e grama. Um campo de futebol surgiu entre as árvores. O antigo
lago deu lugar a dois tanques de peixes contidos por pedras nativas da
região e interligados por uma cascata. Ali boiam pedalinhos em formato
de cisne. A área passou a ser protegida por grandes cercas vigiadas por
câmeras de segurança, canil e guardas armados.
O que mais chamou atenção, além da rapidez dos trabalhos, é que tudo
foi feito fora dos padrões convencionais. A reforma durou pouco mais de
três meses. Alguns funcionários da obra chegavam de ônibus, ficavam em
alojamentos separados e eram proibidos de falar com os operários
contratados informalmente na região e orientados a não fazer perguntas.
Os operários se revezavam em turnos de dia e de noite, incluindo os fins
de semana. Eram pagos em dinheiro. "Ajudei a fazer uma das varandas da
casa principal. Me prometeram 800 reais, mas me pagaram 2 000 reais a
mais só para garantir que a gente fosse mesmo cumprir o prazo, tudo em
dinheiro vivo", diz Cláudio Santos. "Nessa época a gente ganhou dinheiro
mesmo. Eu pedi 6 reais o metro cúbico de material transportado. Eles me
pagaram o dobro para eu acabar dentro do prazo. Era 20 000 por vez.
Traziam o envelopão, chamavam no canto para ninguém ver, pagavam e iam
embora", conta o caminhoneiro Dário de Jesus. Quem fazia os pagamentos?
"Só sei que era um engenheiro que esteve na obra do Itaquerão. Vi a foto
dele no jornal", recorda-se Dário.
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