Continua repercutindo um vídeo levado ao ar na noite de ontem (21) pelo ‘Fantástico’, da Rede Globo, no qual o deputado federal Aelton Freitas (PR-MG) dá lições de como enganar os eleitores mais incautos.
No vídeo, o parlamentar ensina como se disputa uma eleição comprando votos e espalhando boatos sobre os concorrentes.
Antes de ser eleito deputado, ele foi senador, no lugar de José Alencar, que deixou o Senado para assumir a vice-presidência da República, em 2003.
O vídeo obtido pelo Fantástico foi gravado em setembro de 2012, na retal final das eleições para vereador e prefeito. O deputado está em um restaurante em Capetinga, interior do estado.
Na mesa, estão o então prefeito da cidade, Carlos Roberto Custódio, conhecido como Carlito, o candidato a prefeito, Donizete do Escritório, e o candidato a vice, Adriano do Gás. Também estão na mesa as mulheres deles e um assessor do deputado.
O grupo está reunido para receber ensinamentos políticos de Aelton Freitas sobre como uma fazer campanha eleitoral.
Lição número 1 – como comprar votos (A técnica do ‘cartãozinho’): “Nós vamos fazer 200 cartõezinhos para prefeito. Não quer dizer nada, 200 cartõezinhos. E nós vamos pegar 20 amigos nossos confiáveis. Quem é da confiança? Vinte. Então você vai ter dez, você vai ter dez, você vai ter dez. Você vai buscar dez companheiros seus lá e que não estão votando no Donizete”.
E quanto vale o voto de um eleitor? Segundo Aelton: “Esse cartãozinho vale R$ 100. O cara não vai votar em você. Vai votar nos R$ 100 que o cartãozinho que está no bolso dele vale. E outra: só vão pagar se tiver sido eleito”.
Lição número 2 – como espalhar boatos contra o adversário: É preciso convocar o esquadrão da fofoca: “Vamos buscar três, quatro pessoas dentro do nosso grupo que saiba incomodar o Daniel”, ensina no vídeo.
Daniel Bertholdi era um dos candidatos a prefeito de Capetinga, adversário de Donizete do Escritório.
“Três ou quatro pessoas que possam estar em boteco ou em ponta de rua soltando boato e fofoca. Porque o Daniel tem que desmentir e perder tempo naquilo. Não você. A cúpula da campanha, que está por cima, nem conhece. Baixa o retrovisor e esquece que tem concorrente. Vocês estão indo em uma viagem ao futuro de Capetinga, pronto”, diz.
Depois dessas lições, Aelton explica como retribui a votação recebida: ele usa a verba das chamadas emendas parlamentares para favorecer os municípios onde obteve mais votos. “Um parlamentar tem R$ 12 milhões de emenda por ano. Eu procuro distribuir essas emendas proporcionais aos votos que eu tenho. Eu preciso de 100 mil votos e tenho R$ 12 milhões, eu divido R$ 12 milhões por 100 mil votos. Significa dizer que, a cada mil votos que eu tenho em uma cidade, aquela cidade tem R$ 120 mil meu por ano. Está certo?”.
Capetinga tem pouco mais de 7 mil habitantes e mais de 6.100 eleitores. As eleições de 2012 tiveram quase 5 mil votos válidos. Lá, o eleitor se queixa de abandono das autoridades. “Não tem transporte aqui, uma pobreza lascada”, reclama o pedreiro Antônio Flavio Terra.
Um homem que trabalhou para o então candidato Donizete do Escritório, apoiado pelo deputado federal, confirma que a campanha comprou votos, sim, usando a técnica do cartãozinho.
Repórter: Você chegou a distribuir cartões?
Testemunha: Cheguei. Cheguei a distribuir.
Repórter: Quem te deu o cartão para distribuir?
Testemunha: O próprio Donizete.
No vídeo, o deputado federal afirma que o dinheiro só pode ser pago depois da vitória do candidato. Mas uma eleitora afirma que Donizete, que acabou perdendo a eleição, estava tão convencido da vitória que pagou adiantado: “O candidato Donizete pensou que já tinha ganhado a eleição. Aí ele resolveu pagar o pessoal uma semana antes porque ele ‘contou’ vitória”.
Repórter: O voto era comprado de outras formas?
Testemunha: De várias formas. Uma conta de água paga, uma conta de luz paga, um táxi, uma consulta com um médico, uma cesta básica.
Eleitores dizem que a compra de votos é comum na região. “Dá cesta básica, dá material de construção, dá bujão de gás, dá o que pede”, diz uma aposentada.
O candidato a prefeito de Capetinga, Donizete do Escritório, nega tudo: “Nós não usamos isso aí. Estava confiante que ia ganhar, estava bem na frente das cotações. Então não tinha nem motivo para isso”, afirma.
O Fantástico tentou falar com o então prefeito, Carlos Roberto Custódio, o ‘Carlito,’ que também estava na reunião. “Ele está viajando. Nem telefone eles levaram”, respondeu uma mulher.
Uberaba é a principal base eleitoral do deputado Aelton de Freitas. O Fantástico também foi até o local e mostrou o vídeo para ele. “Em reuniões fechadas, quando a gente faz com um grupo de companheiros, de repente a gente fala muita coisa que não deve, que não pode. O que eu falei ali foi em uma reunião fechada, entre companheiros, que nem gravando eu sabia que estava”, explicou.
O vídeo contradiz o deputado: por duas vezes, Aelton Freitas se mostra preocupado com a gravação. “Se a eleição estiver fácil, é uma coisa. Se não estiver, são estratégias que nós temos. Você é bem companheiro? Porque ele está gravando”, avisa em um trecho.
A segunda é logo na sequência da explicação da técnica do cartãozinho. “Vai votar nos R$ 100 que o cartãozinho que está no bolso dele vale. E outra: só vai pagar se tiver sido eleito. Por isso que eu perguntei se está gravando, se é bem companheiro, porque é uma tacada”.
“Tinha uma pessoa com a câmera, outra com máquina fotográfica, outro com celular. Falei: ‘aqui é tudo companheiro? Posso falar o que eu penso?’ ‘Pode, não estão gravando’”, ele justifica.
O deputado nega que tenha ensinado a comprar votos na eleição municipal de Capetinga e afirma que jamais comprou votos: “Eu nunca participei, eu nunca comprei. Estou há 20 anos na política, nunca comprei”.
Segundo ele, tudo não passou de brincadeira. “Fiz alguma brincadeira, que eu sou muito de contar piada em reuniões, depois pedi desculpas no final da reunião pelo que eu tinha falado e pelas brincadeiras de mau gosto, me despedi e fui embora. Porque, quando é brincadeira, pode fazer de mau gosto, igual quando você brinca, às vezes, com a raça, com a cor de uma pessoa, você conta uma piada pesada, aquilo pode se tornar um processo”.
Ministério Público
No vídeo, o deputado também ensina como se deve atacar, com boatos e fofocas, a reputação dos adversários. Primeiro, o deputado diz que isso é normal.
Aelton: Isso é natural, é igual jogo. É um jogo, campanha é um jogo.
Repórter: Isso é natural na política?
Aelton: Na campanha.
Repórter: Difamar o adversário? É natural na campanha?
Aelton: Não, não é. Prefiro falar o que você quer ouvir: não é.
A pena pra quem compra votos pode chegar a quatro anos de prisão, mais multa. Já os crimes de calúnia, difamação ou injúria podem dar de 3 meses a 2 anos de prisão e também multa.
A Câmara e o Senado estão em recesso. Uma cópia do vídeo foi entregue anonimamente ao Ministério Público em Minas, que enviou o material para a Procuradoria Geral da República. (Fonte/foto: G1)
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