Publicado: Ernildo Arruda, 28.01.2013
A inauguração da primeira unidade do complexo
penitenciário na região metropolitana de Belo Horizonte construída e
administrada por uma parceria público-privada reacendeu a polêmica sobre a
oportunidade e o alcance da terceirização de presídios no País. A controvérsia
começou, no plano doutrinário, na década de 1980 e entrou na agenda política na
década seguinte, quando o Governo Fernando Henrique estimulou os Estados a
terceirizar a gestão de estabelecimentos penais. Segundo os dirigentes do
Ministério da Justiça da época, a terceirização desburocratizaria os presídios
e possibilitaria uma significativa economia de recursos, num período em que nem
a União nem os Estados dispunham de recursos suficientes para investir no
setor.
Nesse sistema, os serviços básicos - como segurança
- são de responsabilidade de empresas privadas. Nos EUA, a iniciativa privada
assume total responsabilidade pela direção e gestão administrativa, financeira
e disciplinar de algumas prisões. Na França, Bélgica e Holanda, empresas
privadas e poder público compartilham essas funções.
No Brasil, Paraná e Pernambuco foram os primeiros
Estados a adotar esse modelo, há mais de dez anos. Com o tempo, alguns Estados
entregaram a gestão de algumas penitenciá rias às Associações de Proteção e
Assistência aos Condenados - ONGs especializadas na gestão de unidades com 60 presos de menor
periculosidade e sem ligações com organizações criminosas. Essas unidades são
geridas por voluntários oriundos das mesmas cidades dos condenados, o que ajuda
na sua reeducação e ressocialização.
O problema desse modelo é sua escala, pequena
demais face à magnitude dos problemas do sistema penitenciário, que tem um
déficit de 194 mil vagas, segundo o Ministério da Justiça. Em 1994, o País
dispunha de 511 presídios. Em 2009, eram 1.806. Apesar do número de presídios,
cadeiões e penitenciárias ter triplicado, entre 2000 e 2009, o sistema
penitenciário recebeu, em média, 65% mais presos do que as vagas disponíveis.
Em 2010, as penitenciárias tinham 303.850 vagas, mas a população carcerária era
de 498.500 presos. Por causa do déficit de vagas, 57.195 presos aguardavam
julgamento em carceragens policiais.
Construída por um consórcio de cinco empresas, a
primeira unidade do complexo penitenciário com gestão privatizada na região
metropolitana de Belo Horizonte foi planejada para acolher 608 presos. A
alimentação, a saúde e a educação deles ficarão por conta de um consórcio, que
vai receber mensalmente do governo mineiro R$ 2,8 mil por preso, durante os
próximos 27 anos. Ao justificar esse valor, as autoridades mineiras afirmam que
o investimento foi alto, pois a unidade conta com duas torres de monitoramento,
300 câmeras de segurança e dispositivos para abertura e fechamento de portões e
funcionamento de energia elétrica - além de oficinas de trabalho, colchões
antichama, lâmpadas de baixa voltagem e paredes sem tomadas elétricas.
Esse modelo de gestão penitenciária, contudo,
sempre foi criticado pelo Ministério Público , por juízes criminais e
por especialistas em segurança pública. Eles alegam que a experiência não deu
certo nos Estados Unidos, Japão, Itália, França e Inglaterra - entre outros
motivos porque não reduziu o déficit de vagas do sistema prisional e não
criou condições para a reeducação e ressocialização dos presos, submetendo-os a
um tratamento desumano.
Também apontam a incompatibilidade entre o regime
de confinamento dos presos nas penitenciárias terceirizadas e os direitos a
eles concedidos pela Lei de
Execução Penal.
Nessa polêmica, os defensores do modelo afirmam que
a terceirização dos presídios torna a gestão das penitenciárias mais racional,
uma vez que as empresas entram numa competição para ver qual delas é a mais
eficiente e lucrativa. Já os críticos lembram que, no Estado de Direito, a
responsabilidade pela gestão prisional é função pública exclusiva do poder
público, por envolver privação de liberdade, não podendo ser delegada a
terceiros. No que têm toda a razão. (O Estado de S. Paulo)
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